I Trail Running de Vila Pouca de Aguiar
1 de junho de 2014
"Se alguém te obrigar a acompanha-lo durante um quilómetro, acompanha-o durante dois." (MT 5, 41-42)
Havia convencido a Helena a participar neste trail. Havia feito de tudo para que ela estivesse presente na primeira corrida em que ia participar no meu concelho. Inclusive, havia sugerido á organização que lhe endereçasse um convite, ou não se tratasse da campeã nacional de corridas de montanha em veteranos femininos.
Havia pedido aos meus pais e ao meu irmão que fizessem os possíveis por estar presentes num dos pontos de passagem, e/ou, no final da prova. Havia feito um prognóstico sobre o meu tempo de passagem no local sugerido e o tempo em que, correndo bem a prova, poderia terminar o desafio.
Havia informado alguns familiares residentes numa das aldeias que íamos atravessar, da minha participação na prova, e o quanto desejava vê-los aplaudir-me, ou simplesmente ver-me passar.
E agora, aqui estou eu, perfilado junto de cerca de 200 atletas, ao lado da minha amiga Helena, camelbak ás costas, protetor solar colocado, e um pouco impaciente pelo retardar do inicio da corrida. Aguardo com grande ansiedade e espectativa o que as minhas gentes podem fazer em prol desta atividade desportiva, e o carinho e entusiasmo com que os residentes vão ou não brindar os atletas participantes. Estamos prestes a estrear-nos num trail. É o nosso batismo em corridas desta natureza. A partir de agora e até que o futuro nos separe, o relato será no plural, pois é com a Helena que vou fazer esta corrida. Temos um acordo de cavalheiros. Ela veio fazer o trail, prometendo eu que a acompanho, e a carrego ao colo se ela necessitar. E como ela é levezinha, e temos um ritmo de corrida muito semelhante, não vou ter dificuldades em cumprir com a minha promessa.
Parece tudo reunido para uma excelente manhã desportiva e competitiva, com muita diversão e quilómetros de adrenalina. O tiro de partida é dado já perto das 10 horas, com uma temperatura bastante agradável. O sol está radiante, mas o calor é suportável.
Começamos a um ritmo moderado, quase na cauda do pelotão. Não queremos entrar em loucuras, esperam-nos 34 duros quilómetros, e a segunda metade da prova é muito exigente. O primeiro quilómetro é feito ainda dentro do perímetro da vila, embrenhamo-nos depois na mata que nos vai conduzir ao primeiro ponto de interesse desta corrida, o Castelo de Aguiar. Ao 2º quilómetro deparamo-nos com o primeiro azar que caiu sobre os atletas. O Caneca, um atleta conhecido da Helena, com quem almoçamos a seguir á meia maratona de Viana do Castelo, está estendido no chão, com o joelho todo rasgado, a ser assistido ( levou 12 pontos, e ficou privado de lutar pelos primeiros lugares da prova).
Disfrutamos ao máximo da beleza destes primeiros quilómetros. Caminhos estreitos, que nos obrigam a correr em fila indiana e sem grande margem para ultrapassagens. A vasta vegetação protege-nos dos raios solares. A descontração com que fazemos a corrida permite-nos conversar, fazer poses para as fotografias, e fazer uma pequena pausa para satisfazer as necessidades fisiológicas.
Aproximamo-nos do Castelo, e a pequena subida que o antecede, trata-se sem dúvida da grande dificuldade da primeira fase da prova. Como já fiz o reconhecimento do percurso, alerto os atletas ao meu lado, e a Helena em particular para o momento mais difícil: Está quase, está quase, está quase! Com umas gotas mais de suor vencemos a subida e preparamo-nos para a tomada do Castelo.
O Castelo de Aguiar, isolado e inexpugnável como um ninho de águias, é uma pequena fortificação edificada nos contrafortes da serra do Alvão. A sua ocupação de carácter militar remonta ao período romano, altura em que se edificou um reduto defensivo protetor que ligava Chaves ( Aquae Flaviae) a Lamego (Lamecum). Foi ainda palco de um dos muitos episódios da campanha de D.Afonso Henriques em prol da independência do Condado Portucalense.
Com 49 minutos de corrida, e depois de calcorreados 8 quilómetros, conquistamos por fim o Castelo. É como uma pequena batalha ganha na guerra que é terminar este desafio. O que se segue ao Castelo é uma pequena armadilha da organização. A passagem faz-se entre grandes rochas, com uma possível passagem superior, e uma outra inferior. Sem qualquer informação subimos a rocha, até nos dar-mos conta de que a passagem se faz entre as fendas das rochas. Com muitas lamúrias á mistura descemos e fazemo-nos pequeninos para passar-mos entre elas.
Os quilómetros que se seguem são de pequena dificuldade. Apenas uma ou outra subida mais difíceis, mas muito curtas. Só temos de rolar e suportar o sol que incide sobre nós, nesta fase do percurso sem vegetação frondosa que nos proteja. Registo a nossa passagem pelos 9 quilómetros sobre a 1 hora de corrida, e ainda frescos como uma alface.
O segundo ponto de interesse está reservado para a passagem na Barragem da Falperra. Situada em plena serra do Alvão, e ladeada por uma belíssima mata, salpicadas aqui e ali de imponentes fragas que circundam todo o lago. É uma belíssima e agradável zona de lazer e de repouso, propícia ao convívio e ao contacto com a natureza.
Continuamos a avançar a bom ritmo, a galgar quilómetros e a eliminar dificuldades. Com 1h45' devoramos facilmente os primeiros 16 quilómetros do percurso. Aproximamo-nos do ponto em que se separam o trail longo, aquele que vamos seguir, e o trail curto prestes a terminar. Á passagem pelo túnel sob a A24, solto um: Já se cansaram? Como estamos só os dois, a resposta é NÃO. Entramos na segunda fase da corrida, mais difícil, mais técnica, mais exigente, apenas reservada aos mais resistentes. Pergunto a um voluntário da organização quando por ele passamos, quantos vão á nossa frente. Dez? Pergunto eu. Mesmo sabendo que este número está longe de corresponder á realidade da prova, o número que ele dispara surpreende-me. Uns 30. E mulheres? Nova cara de espanto. É a segunda. Mesmo a um ritmo confortável, com muita diversão á mistura, estamos a fazer uma excelente prova. Vais ter que dividir comigo o prémio do segundo lugar! Mas, cem metros volvidos sobre estes festejos, a Helena começa a sentir-se mal. Temos que parar, tentar que ela recupere, o que vem a revelar-se inútil. A arritmia que diz sentir, teima em não passar. Um, dois, três, uma mulher, outra mulher, e mais outros tantos atletas vão passando por nós. Como bons desportistas vão oferecendo ajuda. Mas não há muito que possamos fazer, apenas descansar e esperar que a Helena se recomponha. Para que a situação seja ainda mais dramática, acontece precisamente num dos troços mais difíceis da prova. Sobe e desce constante, escalada, descidas vertiginosas, vegetação densa que obstrui o caminho. A espaços vamos trotando algumas dezenas de metros. O problema teima em não passar. Depois de uma longa descida, e antes de abordar-mos a mais difícil das subidas da zona, a Helena diz-me que não consegue continuar. A desistência parece ser irrevogável. Pede-me que continue sem ela. Por momentos deixo de pensar no compromisso que assumi, e penso nas pessoas que aguardam ansiosamente a minha passagem. Como o seguinte ponto de reabastecimento está próximo, sigo a minha prova e mando um dos voluntário ir ter com a Helena.
Talvez tenha cometido um grande erro em abandonar a Helena, mas a partir de agora estou por minha conta. E mais do que perder a minha parceira de corrida, perdi a experiencia que me permitia manter um ritmo de corrida equilibrado e confortável.
Os quilómetros que se seguem não vão ser fáceis. Depois da travessia do topo da serra do Alvão até ao topo da serra da Padrela, segue-se um constante sobe e desce até á meta. Mas o momento que eu mais aguardo desde o inicio da prova, está prestes a acontecer. A passagem pela aldeia de Vila Meã, onde tenho família, e o local que sugeri aos meus pais para estarem presentes. Mas a juntar á dificuldade da subida, junta-se a ausência das pessoas que esperava encontrar. Apenas o meu tio Henrique se encontra no local. Começo a ficar sem energia, sem animo, sem forças. A ausência da Helena e a ausência do incentivo da família desmotivam-me. As subidas já só as consigo fazer a caminhar. Nas descidas ainda consigo trotar um pouco. Pelo caminho encontro atletas em pior situação do que eu. O primeiro que vejo, está sentado na berma á espera de assistência. Então? Acabou? Ficou na berma a escassos 4 quilómetros da meta. Eu vou aguentando. Devagar. Devagarinho. Com mais de 4 horas de prova nas pernas.
Deparo-me com nova situação de dificuldade de um atleta. Encostado a um pinheiro, em clara dificuldade, vomita toda a água que ingeriu durante a prova. Apesar de também eu sentir algumas náuseas, vou resistindo a semelhante fim. A escassos 2 quilómetros da meta, abandono o sobe e desce da mata, e entro na ciclovia.
A partir de agora é trotar, em terreno plano, até á tão ansiada meta. Sou ainda abordado por um atleta que me pede uma perna emprestada para chegar ao fim. Deixo de trotar e caminho algumas centenas de metros a seu lado. Conversamos um pouco, mas a partir do momento em que recomeço a correr, ele não consegue conciliar a corrida e a conversa. Está em claras dificuldades físicas.
Últimos metros. O momento mais desejado está a escassos 300 metros. Mas antes, tempo para a melhor das surpresas. Para o melhor dos momentos. A minha fã número um, ao lado do meu irmão, aplaude-me. Apanhou-me de surpresa. Não resisto, e porque ela o merece, dirijo-me á minha mãe e dispenso-lhe dois beijos. Só por este momento, valeu todo o sofrimento de 4h31'. Faço os restantes metros eufórico, mas a chegada á meta é dececionante. Não há público, não consigo terminar junto da Helena como prometido, e o tempo final não é o que estava á espera.
E porque comigo, as dificuldades das grandes corridas não terminam após a chegada á linha de meta, as horas seguintes foram angustiantes e de grande sofrimento. Foram largas horas sem conseguir ingerir líquidos nem sólidos, e a vomitar tudo o que bebi, e o que não bebi.
Uma nota para a organização. Estiveram quase perfeitos. Grande acompanhamento dos voluntários ao longo da prova. Número de abastecimentos ideal. O percurso apesar de duro e difícil, é belo e agradável. Não me posso pronunciar sobre o almoço convívio porque não estava presente.
P.S. Depois de abandonar a Helena, e de a organização ter chamado uma ambulância, ela recuperou e terminou a prova apenas 26 minutos depois de mim.
Para a estatística:
Trail número 1
Distância: 34 km
Tempo líquido:4h31'30'' ( a 1h34' do vencedor)
Classificação masculinos: 60 (79)
Havia pedido aos meus pais e ao meu irmão que fizessem os possíveis por estar presentes num dos pontos de passagem, e/ou, no final da prova. Havia feito um prognóstico sobre o meu tempo de passagem no local sugerido e o tempo em que, correndo bem a prova, poderia terminar o desafio.
Havia informado alguns familiares residentes numa das aldeias que íamos atravessar, da minha participação na prova, e o quanto desejava vê-los aplaudir-me, ou simplesmente ver-me passar.
E agora, aqui estou eu, perfilado junto de cerca de 200 atletas, ao lado da minha amiga Helena, camelbak ás costas, protetor solar colocado, e um pouco impaciente pelo retardar do inicio da corrida. Aguardo com grande ansiedade e espectativa o que as minhas gentes podem fazer em prol desta atividade desportiva, e o carinho e entusiasmo com que os residentes vão ou não brindar os atletas participantes. Estamos prestes a estrear-nos num trail. É o nosso batismo em corridas desta natureza. A partir de agora e até que o futuro nos separe, o relato será no plural, pois é com a Helena que vou fazer esta corrida. Temos um acordo de cavalheiros. Ela veio fazer o trail, prometendo eu que a acompanho, e a carrego ao colo se ela necessitar. E como ela é levezinha, e temos um ritmo de corrida muito semelhante, não vou ter dificuldades em cumprir com a minha promessa.
Parece tudo reunido para uma excelente manhã desportiva e competitiva, com muita diversão e quilómetros de adrenalina. O tiro de partida é dado já perto das 10 horas, com uma temperatura bastante agradável. O sol está radiante, mas o calor é suportável.
Começamos a um ritmo moderado, quase na cauda do pelotão. Não queremos entrar em loucuras, esperam-nos 34 duros quilómetros, e a segunda metade da prova é muito exigente. O primeiro quilómetro é feito ainda dentro do perímetro da vila, embrenhamo-nos depois na mata que nos vai conduzir ao primeiro ponto de interesse desta corrida, o Castelo de Aguiar. Ao 2º quilómetro deparamo-nos com o primeiro azar que caiu sobre os atletas. O Caneca, um atleta conhecido da Helena, com quem almoçamos a seguir á meia maratona de Viana do Castelo, está estendido no chão, com o joelho todo rasgado, a ser assistido ( levou 12 pontos, e ficou privado de lutar pelos primeiros lugares da prova).
Momento inicial da corrida, ainda em fila indiana. |
Disfrutamos ao máximo da beleza destes primeiros quilómetros. Caminhos estreitos, que nos obrigam a correr em fila indiana e sem grande margem para ultrapassagens. A vasta vegetação protege-nos dos raios solares. A descontração com que fazemos a corrida permite-nos conversar, fazer poses para as fotografias, e fazer uma pequena pausa para satisfazer as necessidades fisiológicas.
Aproximamo-nos do Castelo, e a pequena subida que o antecede, trata-se sem dúvida da grande dificuldade da primeira fase da prova. Como já fiz o reconhecimento do percurso, alerto os atletas ao meu lado, e a Helena em particular para o momento mais difícil: Está quase, está quase, está quase! Com umas gotas mais de suor vencemos a subida e preparamo-nos para a tomada do Castelo.
O Castelo de Aguiar, isolado e inexpugnável como um ninho de águias, é uma pequena fortificação edificada nos contrafortes da serra do Alvão. A sua ocupação de carácter militar remonta ao período romano, altura em que se edificou um reduto defensivo protetor que ligava Chaves ( Aquae Flaviae) a Lamego (Lamecum). Foi ainda palco de um dos muitos episódios da campanha de D.Afonso Henriques em prol da independência do Condado Portucalense.
Com 49 minutos de corrida, e depois de calcorreados 8 quilómetros, conquistamos por fim o Castelo. É como uma pequena batalha ganha na guerra que é terminar este desafio. O que se segue ao Castelo é uma pequena armadilha da organização. A passagem faz-se entre grandes rochas, com uma possível passagem superior, e uma outra inferior. Sem qualquer informação subimos a rocha, até nos dar-mos conta de que a passagem se faz entre as fendas das rochas. Com muitas lamúrias á mistura descemos e fazemo-nos pequeninos para passar-mos entre elas.
Um dos belos momentos da prova. |
Os quilómetros que se seguem são de pequena dificuldade. Apenas uma ou outra subida mais difíceis, mas muito curtas. Só temos de rolar e suportar o sol que incide sobre nós, nesta fase do percurso sem vegetação frondosa que nos proteja. Registo a nossa passagem pelos 9 quilómetros sobre a 1 hora de corrida, e ainda frescos como uma alface.
O segundo ponto de interesse está reservado para a passagem na Barragem da Falperra. Situada em plena serra do Alvão, e ladeada por uma belíssima mata, salpicadas aqui e ali de imponentes fragas que circundam todo o lago. É uma belíssima e agradável zona de lazer e de repouso, propícia ao convívio e ao contacto com a natureza.
A prova da boa disposição com que encaramos o desafio. |
Continuamos a avançar a bom ritmo, a galgar quilómetros e a eliminar dificuldades. Com 1h45' devoramos facilmente os primeiros 16 quilómetros do percurso. Aproximamo-nos do ponto em que se separam o trail longo, aquele que vamos seguir, e o trail curto prestes a terminar. Á passagem pelo túnel sob a A24, solto um: Já se cansaram? Como estamos só os dois, a resposta é NÃO. Entramos na segunda fase da corrida, mais difícil, mais técnica, mais exigente, apenas reservada aos mais resistentes. Pergunto a um voluntário da organização quando por ele passamos, quantos vão á nossa frente. Dez? Pergunto eu. Mesmo sabendo que este número está longe de corresponder á realidade da prova, o número que ele dispara surpreende-me. Uns 30. E mulheres? Nova cara de espanto. É a segunda. Mesmo a um ritmo confortável, com muita diversão á mistura, estamos a fazer uma excelente prova. Vais ter que dividir comigo o prémio do segundo lugar! Mas, cem metros volvidos sobre estes festejos, a Helena começa a sentir-se mal. Temos que parar, tentar que ela recupere, o que vem a revelar-se inútil. A arritmia que diz sentir, teima em não passar. Um, dois, três, uma mulher, outra mulher, e mais outros tantos atletas vão passando por nós. Como bons desportistas vão oferecendo ajuda. Mas não há muito que possamos fazer, apenas descansar e esperar que a Helena se recomponha. Para que a situação seja ainda mais dramática, acontece precisamente num dos troços mais difíceis da prova. Sobe e desce constante, escalada, descidas vertiginosas, vegetação densa que obstrui o caminho. A espaços vamos trotando algumas dezenas de metros. O problema teima em não passar. Depois de uma longa descida, e antes de abordar-mos a mais difícil das subidas da zona, a Helena diz-me que não consegue continuar. A desistência parece ser irrevogável. Pede-me que continue sem ela. Por momentos deixo de pensar no compromisso que assumi, e penso nas pessoas que aguardam ansiosamente a minha passagem. Como o seguinte ponto de reabastecimento está próximo, sigo a minha prova e mando um dos voluntário ir ter com a Helena.
Momento em que peço á organização assistência para a Helena. |
Talvez tenha cometido um grande erro em abandonar a Helena, mas a partir de agora estou por minha conta. E mais do que perder a minha parceira de corrida, perdi a experiencia que me permitia manter um ritmo de corrida equilibrado e confortável.
Os quilómetros que se seguem não vão ser fáceis. Depois da travessia do topo da serra do Alvão até ao topo da serra da Padrela, segue-se um constante sobe e desce até á meta. Mas o momento que eu mais aguardo desde o inicio da prova, está prestes a acontecer. A passagem pela aldeia de Vila Meã, onde tenho família, e o local que sugeri aos meus pais para estarem presentes. Mas a juntar á dificuldade da subida, junta-se a ausência das pessoas que esperava encontrar. Apenas o meu tio Henrique se encontra no local. Começo a ficar sem energia, sem animo, sem forças. A ausência da Helena e a ausência do incentivo da família desmotivam-me. As subidas já só as consigo fazer a caminhar. Nas descidas ainda consigo trotar um pouco. Pelo caminho encontro atletas em pior situação do que eu. O primeiro que vejo, está sentado na berma á espera de assistência. Então? Acabou? Ficou na berma a escassos 4 quilómetros da meta. Eu vou aguentando. Devagar. Devagarinho. Com mais de 4 horas de prova nas pernas.
Deparo-me com nova situação de dificuldade de um atleta. Encostado a um pinheiro, em clara dificuldade, vomita toda a água que ingeriu durante a prova. Apesar de também eu sentir algumas náuseas, vou resistindo a semelhante fim. A escassos 2 quilómetros da meta, abandono o sobe e desce da mata, e entro na ciclovia.
Fase final da corrida, antes da entrada na ciclovia. |
A partir de agora é trotar, em terreno plano, até á tão ansiada meta. Sou ainda abordado por um atleta que me pede uma perna emprestada para chegar ao fim. Deixo de trotar e caminho algumas centenas de metros a seu lado. Conversamos um pouco, mas a partir do momento em que recomeço a correr, ele não consegue conciliar a corrida e a conversa. Está em claras dificuldades físicas.
Últimos metros. O momento mais desejado está a escassos 300 metros. Mas antes, tempo para a melhor das surpresas. Para o melhor dos momentos. A minha fã número um, ao lado do meu irmão, aplaude-me. Apanhou-me de surpresa. Não resisto, e porque ela o merece, dirijo-me á minha mãe e dispenso-lhe dois beijos. Só por este momento, valeu todo o sofrimento de 4h31'. Faço os restantes metros eufórico, mas a chegada á meta é dececionante. Não há público, não consigo terminar junto da Helena como prometido, e o tempo final não é o que estava á espera.
Já esta. Mais um desafio superado. |
E porque comigo, as dificuldades das grandes corridas não terminam após a chegada á linha de meta, as horas seguintes foram angustiantes e de grande sofrimento. Foram largas horas sem conseguir ingerir líquidos nem sólidos, e a vomitar tudo o que bebi, e o que não bebi.
Uma nota para a organização. Estiveram quase perfeitos. Grande acompanhamento dos voluntários ao longo da prova. Número de abastecimentos ideal. O percurso apesar de duro e difícil, é belo e agradável. Não me posso pronunciar sobre o almoço convívio porque não estava presente.
P.S. Depois de abandonar a Helena, e de a organização ter chamado uma ambulância, ela recuperou e terminou a prova apenas 26 minutos depois de mim.
Para a estatística:
Trail número 1
Distância: 34 km
Tempo líquido:4h31'30'' ( a 1h34' do vencedor)
Classificação masculinos: 60 (79)