segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

KM 26 - 24 Horas Ultrafundo em pista- Barcelona




24 Horas de Ultrafundo em Pista
BARCELONA

17/18 de Dezembro de 2016

Foto: Sergi Cusco


Foto Sergi Cusco

        Eu chamo-lhe PAIXÃO


       Sim, sim, sim, sim, sim, sim, sim...

       Sim, quero voltar a Can Dragó.
       Sim, quero voltar a Barcelona, a Vigo, a Vale de Cambra.
       Sim, quero voltar a enfrentar estes desafios de  24 horas.
       Quero voltar a correr, a caminhar, a sofrer e a chorar.
       Quero voltar a dividir pista com estas máquinas do ultrafundo.
   Quero voltar a competir com atletas que não olham à classificação, e que lutam apenas pelo objetivo individual. Seja ele os 100, 150, 200, ou 250 quilómetros.
       Quero voltar a lutar pelos 160 quilómetros.
  Quero...Chamem-lhe competição. Eu chamo-lhe aliança, cooperação, cumplicidade, ajuda e amizade.
    Chamem-lhe masoquismo. Eu chamo-lhe alegria, felicidade, paixão.
      Quero voltar a traçar objetivos. Quero voltar a lutar por eles. Mesmo que no final sinta um sabor amargo por me ter faltado um pouquinho assim para o conseguir. E a quem não faltou um pouquinho assim?   
         Quero voltar a sofrer, a bom sofrer. 
         Quero voltar a ter sono, e não poder dormir.
         Quero voltar a ter frio, e não conseguir aquecer.
         Quero estar cansado e continuar a correr.
         Quero estar nauseado e não conseguir vomitar.
         Quero contar voltas, minutos, horas, quilómetros.
        Quero voltar a ter uma falange de apoio pendente durante 24 horas.



        Post nº1

       5h 45km. pos. 71

         " Venga ahí campeón!!!Orgulloso de ti"
         " Força"
         "Animo Paulo, vas fenomenal."
         "Animoooo muxo animo"
         "Si que puedes si si"
         "Go go go"

         Dar 21 voltas à pista por hora, em 3 séries de 6 a correr, e uma a caminhar. Ao final da hora teria acumulado 9 km. Revendo agora este post, reparo que até às 5 horas estava a cumprir com a estratégia, que visava sobretudo retardar o cansaço e as náuseas.

      Post nº2

        7h 60km. pos.  71.lol

        "Ole ole"
        "Vamos"
        "Venga Paulo..."
        "Força"
        "VAmossss"
        "Veña Paulo que vas como una moto"
        "Estás a exagerar..."

    Começava a sentir os primeiros sinais de cansaço, surgiam as náuseas, e começava a ter necessidade de me alimentar a sério.

        Post nº3

     9h 76km pos. 75
     pasta time

  Mostrar mais rComenta
"Bom apetite e dalhe com força..."
"Animo y buen provecho"
"Vamos vamos"
"Pero ti a que vas a Barcelona a comer ou correr.jeje Veña a polos 160"
"Bom apetite"
"Bom proveito e bom descanso"
"Bom apetite, e come muita massa, devias comer marmelada que dá muita força, continua 
      Este evento consegue reunir os melhores ultramaratonistas europeus da especialidade. Mas a nível de organização está a anos luz de Vigo, ou mesmo de Vale De Cambra. Desde logo a começar no lugar que te reservam nas boxes, ou melhor, no lugar que não te reservam. Nem uma simples cadeira têm para te oferecer. E depois, o abastecimento, é do mais pobre que se pode encontrar. Que saudades da minha sopa que costumo levar. Ou mesmo os salgados que me costumam acompanhar. Valeu-me que tinham à disposição tangerinas. Comi alguns quilos delas. A certa altura pedi mesmo que se limitassem a descascá-las, e as deixassem inteiras para não ter que reunir os favos. 

      Post nº 4
       

       13:20h 100 km. A partir de agora vai ser mais difícil fazer quilómetros. Grande bolha no  calcanhar direito.


        "VAMOS PAULO!!!!!!!!"
        "Beijinhos parabéns"
        "Força man"
        "Força...abraço..."

     E não foram só as bolhas. Felizmente consegui eliminar as moléstias que surgiram depois dos 100 quilómetros. As bolhas, recorrendo à colocação de umas meias dobradas debaixo do calcanhar, não mais me magoaram. As fortes dores de joelhos, eliminadas com ibuprofeno. Mais difícil foi enfrentar o frio, e o sono. O sono obrigou-me mesmo a parar durante 10 minutos a cada hora, durante 3 ou 4 horas, para dormir 5 minutos a cada paragem. Se alguém me disser que me viu parado na pista, de olhos fechados a dormir, eu acredito. Porque recordo-me de fechar os olhos em alguns períodos e continuar a caminhar. Por isso é perfeitamente normal que tenha dormido em pé na pista durante breves segundos.

     Post nº 5

Esta quase. Mas a noite foi terrivel. Muito frio. Sono. Nauseas. Bolhas. E ainda muito longe dos 160. Faltam 3h. E 26 km


"Força!"
"Ole ole eres un maquina"

     Foi a noite mais difícil de ultrapassar em todos os 6 desafios de 24 horas até hoje. Sobretudo pelo sono. Nunca senti tanto sono e tanta vontade de dormir. Também o frio foi terrível.  Vesti toda a roupa que levei comigo, e o frio persistia. Durante este período nocturno, uma avaria no sistema informativo que nos colocava a par do número de voltas e de quilómetros, deixou-nos completamente às cegas. Quando pelas 21 horas de prova tenho oportunidade de ver que levo apenas 134 quilómetros, dou-me conta que a noite não foi aproveitada da melhor maneira, e os 160 quilómetros podem  ser impossíveis de alcançar.

      Decorridas as 24 horas, não foi possível chegar à tão desejada marca, mas ficar tão próximo, e poder terminar o desafio sem mazelas, e com vontade de repetir já são vitórias suficientes. E sempre são mais 154 quilómetros. A minha segunda melhor marca. E no meio de tantos ferraris, ficar nos 49 primeiros é optimo.
        "Paulo, Paulo, te acuerdas de mi?" Como podia esquecer o  "personagem" que esteve durante 24 horas, sentado no terceiro banco de pedra após a meta, no parque de Castrelos em Vigo, a apoiar os atletas presentes nas 24 Horas de Vigo?  Em Barcelona apanhou-me literalmente como vim ao mundo, pois preparava-me para tomar um banho. Muito obrigado Ferran e Sílvia pelo vosso apoio. A todos os que me foram enviando mensagens ao longo da prova, tenho a dizer-vos que li todas durante o desafio, e porque sei o quanto estava preocupada comigo, apenas respondi às mensagens que reproduzo em seguida.
          
Mocinho
Mocinho
Mocinho

ola
tou cansado.lol

Olá!:) pois imagino!:))
Força nisso.... Que eu vou agora descansar Y descanço uma beca por ti!:)
Estás a beber umas bjecas ?!???:))))))
nao ha
Estás parido?!?!?
Está a correr bem!?!?
ainda nao
sim
Esta frio?!?
um pouco
agora nao ha sol

vai ficar mais
fui
Xau adeus
Vai dado notícias!:)
                                                                                               SÁB 17:56
moca. ainda nao pari. vou parindo. parando quero dizer
O importante é que estejas bem!:)))) vai devagarinho ....🙂
Vou fazer uma massinha queres?!???
vinha mesmo a calhar
ainda tenho q esprar 2 h pela massinha daqui
fui
Estás com cara de parido!!!!!!:))))

mocinha. ta quase. mas a noite foi terrivel
muito frio. nauseas. bolhas. cansaço.

Ta quase.....mocinho!:)

terça-feira, 6 de setembro de 2016

km 25 - III 24 Horas De Vigo



III 24 HORAS DE VIGO

27 e 28 de Agosto de 2016




           
           
           Muito mais que uma competição.
           Muito mais que 24 horas.
           Muito mais que uma corrida individual.





          Talvez um dia escreva sobre algum feito histórico. Talvez  um primeiro lugar. Talvez um simples pódio. Talvez  o simples facto de chegar aos 200 quilómetros numa prova como esta, de 24 horas. Talvez esse dia chegue, ou talvez não. Talvez sinta algum prazer em escrever sobre essas grandes conquistas, sobre grandes corridas, ou grandes acontecimentos. Ou talvez prefira escrever apenas sobre pequenos momentos de felicidade. Pequenos momentos que se vão sucedendo, e que fazem com que uma grande loucura se transforme no grande momento do ano. Naquele momento que tanto anseias, e para o qual vais contando os dias, as horas e os minutos para o seu início. Para a  minha pequena loucura tinha como objectivo alcançar os 160 quilómetros, ou simplesmente os 158 que correspondiam a um novo recorde pessoal.  Tal objectivo não foi alcançado, mas tudo o resto foi bom. Fui feliz. Em 24 horas de cansaço, de algum sofrimento e de vários momentos de alegria, eu fui feliz. Verdadeiramente feliz.
        Eu costumo dizer que numa prova como esta é muito difícil estabelecer uma estratégia, ou tentar seguir um plano previamente elaborado. A prova é longa, demasiado longa. São 24 longas horas em que tudo pode acontecer. Desde dores musculares, de joelhos, tornozelos.  Ou simples bolhas, má disposição, náuseas, cansaço. Tudo pode acontecer, e alterar por completo o previamente delineado. 
       Chegar aos 60 quilómetros às 8 horas de corrida era o que tinha inicialmente previsto fazer. Ou te sentes com capacidades de abordar a prova e fazer uma média de 9/10 km por hora ao longo das 24 horas, ou simplesmente és modesto o suficiente para saber que tal objectivo não está ao teu alcance, e então procuras ser paciente, e mesmo sabendo que nas primeiras horas podes rodar a esse ritmo, porque estás fresco e ainda não sentes cansaço, ou simplesmente porque o entusiasmo geral te levam a tentar ir na onda de correr sem parar, sabes que mais tarde o vais pagar. É verdade que é muito complicado ver os outros a correr nas primeiras horas, e tu começares estrategicamente a caminhar.  Mas sabes que, à quinta prova de 24 horas, esse é o teu caminho.
     Apesar de ter conseguido este primeiro objectivo, o meu estômago uma vez mais se começa a manifestar. Durante estas primeiras horas apenas um ligeiro desconforto que não me impede de correr, mas entre as 8 e as 14 horas o  desconforto vai crescendo, e nem com paragens mais prolongadas consigo eliminar as náuseas. Mas se me impedem de correr, não me retiram a vontade de permanecer em pista e de caminhar, e vou somando quilómetro a quilómetro até ao objectivo mínimo dos 100 quilómetros que consigo um pouco depois das 16 horas de prova.
         Seria altura de baixar os braços, de me render, de dizer já basta? De deitar a toalha ao chão? Não, não, não. Isso não aconteceu. Graças a pequenos factores que foram ocorrendo ao longo das 24 horas, era impossível render-me. E é nestas alturas que pensas que esta corrida não é só tua. Que esta corrida é como uma prova de estafetas, e cada quilómetro é feito por um atleta diferente. Que em Castrelos, uma vez mais nunca corres só. E então os quilómetros vão-se sucedendo, quer por pequenos factores que ocorreram ou vão ocorrendo. Quer apenas por simples palavras ou gestos. Ou quer apenas pela presença de tantos rostos conhecidos que te animam e incentivam.

Com os MIÑOTOS

          E porque este evento é feito por pessoas, para pessoas e com pessoas que amam a modalidade, cada um dos quilómetros após os 100 têm o carimbo de cada uma delas. Foram feitos a pensar nessas mesmas pessoas. Amigos, conhecidos, adversários. No fundo....todos loucos.
      E então, parto para mais uma voltinha, e  penso que este quilómetro e outros mais que consiga, valem 5.52€ para a Joaninha. E vão 101 quilómetros.
        E Porque os incentivos de Geni não me deixam parar, e volta após volta me vai incentivando e vai procurando saber se estou bem, ou se preciso de alguma coisa. Animo Paulo, vas muy bien. Necessitas algo?  E vão 102 quilómetros para Geni e todas as voluntárias.
       Recentemente enquanto escrevo esta crónica, vi uma foto sua a dormir na nossa tenda, mas ia jurar  que  Ferran Morató esteve durante as 24 horas, sentado no terceiro banco de pedra após a meta a incentivar-nos, e a colocar-me a par do total já acumulado da campanha. Venga, una mas. Y son mas 5.50€.  E vão 103 quilómetros para o Ferran.
          Num período de maior cansaço, Francisco Olivan, o atleta da t-shirt: Limite? El cielo. Down,   anima-me: vamos Paulo, piensa en la niña ( Joana). E vão 104 quilómetros para Down Vigo.

Com Francisco Oliván

         Conversando em espanhol com Pedro Afonso, descobrimos que ambos somos portugueses, e  que já havíamos partilhado pista nos 100 km de Portugal. És português? Eu também sou.  E vão 105 quilómetros para Portugal.
         Já perdi a conta às provas que fiz com Daniel Cerzón. Sempre muito agradável a companhia deste louco amigo ( mais louco do que eu, muito mais). E mesmo a caminhar, os quilómetros vão-se sucedendo. No pares, Dani. Sigue, sigue. No pares!106 quilómetros.
         Depois de um interregno de um ano, está de volta a Castrelos o campeão de 2014, José Manuel Conde. Agora, com 72 anos de idade, vai fazendo inveja junto dos mais jovens. Vamos campeão. E vão 107 quilómetros para o grande campeão.
           Marco Neves que me acompanhou nesta aventura, entrega o chip à equipa de cronometragem depois de ter alcançado os 100 km. Já chega. Não corro mais. Eu vou para uma volta mais. E vão 108 quilómetros.
           O grande obreiro desta maravilhosa prova, José Vidal, diz-me que depois vai ver as fotos e não me vê a correr. Este desafio não se faz só de corrida. E uma vez mais muito obrigado por realizares o teu sonho, que se tornou também o sonho de tantos como eu. E poder escutar o teu Gracias por venir, vale uma volta mais. E vão 109 quilómetros.
           Em 2014 fui o único português. Em 2015 éramos 2. Este ano subiu para 3 o número de individuais e 6 em equipa ( Os Miñotos). E ainda havia um meio português, Niko Bas Roth, um Uruguaio neto de um português. Enquanto me vai contando esta história, dá para terminar mais uma volta. E 110 quilómetros já estão.

Com Niko

       Força Paulo, eu vou já entrar e dou contigo uma volta a caminhar,  diz-me  José Ribeiro, um dos Miñotos a correr por estafetas. Na sua companhia termino mais uma volta, e assim  somo 111 quilómetros. 
        E assim, passo a passo, vou somando, quer quilómetros, quer os euros. E com mais uma passagem na meta cumpro os 112 quilómetros.
    Durante a minha primeira pausa, após alcançar os 60 quilómetros, troquei de roupa, inclusive de meias. Durante esse processo esqueci-me do chip, e dei algumas voltas à pista sem ele. Alertado pela equipa de cronometragem, digo-lhes que dei 2 voltas à pista sem o chip. Adicionam-me essas duas voltas. Mais tarde, consultando o meu relógio, reparo que talvez tenham sido 3 voltas. Assim, pelo sim , pelo não, há que dar uma volta mais. E vão 113 quilómetros.
         A cada paragem pela tenda de apoio, consulto as mensagens de telemóvel, e actualizo dados para todos os que me vão seguindo ao longe. Alguém preocupado em casa me pergunta: Moço, moço, moço, moço. Como estás? Respondo que estou bem. Ainda bem, Não me mintas. Tá bem....(pergunta parva) estás a gostar? Qual acham que foi a minha resposta? Siiiiimm! 114 quilómetros.
       Somos 7 os totalistas desta prova, com  António Benitez  partilhei várias horas durante as 3 edições. Esta talvez seja das três aquela em que passa mais dificuldades. E então que tal? Já Chegaste aos 100 quilómetros?  Diz-me que não. E que provavelmente não chega lá. Queixa-se de tudo e mais alguma coisa. Eu, estranhamente, não sinto quaisquer dores. Estou muito bem. Apenas o desconforto no estômago que me vai atormentando. E vão 115 quilómetros.
     Outro dos totalistas, José Manso. Para alguns de nós aqui presentes, é um exemplo, um modelo a seguir. Uma pubalgia que o vem atormentando há vários meses, colocam-no um ano mais fora da luta pelos primeiros lugares. No puedo mas, me retiro. Intenté hacerlo despacio, pero me duele. No puedo.  Depois de abandonar, não se cansa de nos animar. Um mais....116 quilómetros.
      Já estou muito perto do modesto objectivo que me venho propondo, chegar aos 130 quilómetros, ou aos 131 segundo a minha contagem,  para o caso de  haver a diferença de um volta. E vão 117 quilómetros.
         Para que não restem dúvidas, confirmo o número de voltas junto da equipa de cronometragem. Há defacto a diferença de uma volta. Também essa me é reposta, afinal são 5.52€ mais que muito custam a ganhar. E assim chego aos 118 quilómetros.
          Mais uma atleta d'Os Miñotos, Carla Moreira, se oferece para dar uma volta comigo a caminhar. E então, estás a gostar? Sim, muito. Não estou é preparada para isto. Mas faço a caminhar. Já somos dois, e com uma volta mais, 119 quilómetros.
         Segundo as minhas contas, terminando esta volta consigo 660 € para a Joaninha, mas o que me falta em força e energia, sobra-me em ambição e determinação. Vai ser apenas mais uma de várias que se seguirão. E vão 120 quilómetros para a Joaninha.
        O ano passado foi segundo da geral, mas este ano é voluntário.  É  com  muito agrado que vamos escutando as palavras de incentivo do grande campeão Javier Sobrino. Venga Paulo. Animo. 121 quilómetros.
    Outro grande campeão, terceiro em 2014, é também ele voluntário, mais propriamente na carpa dos individuais. Não se cansa de nos animar, dar conselhos, e prestar alguns auxilios de fisioterapia sempre que são solicitados. Graças a ele chego aos 122 quilómetros.
        Também ele  totalista, mas em estafetas, e um assíduo leitor do meu blogue, Ivan Carreiro, vai-nos animando, e é sempre um prazer poder cumprimentá-lo em todas as provas em que nos cruzamos. O ano passado, na companhia da sua namorada, foram os que mais nos animaram durante o período nocturno. Este ano estrañamos mucho a Vero, mas pensando nos seus incentivos do ano passado faço um quilómetro mais. E vão 123.
       Porque são vari@s ao longo do percurso, e a cada passagem nossa vão fazendo click, quantas mais vezes passarmos, mais fotografias vamos ter. E alguma há-de sair bem. Mi fotografa preferida, digo a uma menina de uns 12/13 anos que nos vai registando. Agora, escrevendo estas notas, sei que se chama Tânia. Gracias mi fotografa preferida.  E assim igualo os 124 quilómetros de 2014.
        Outro fotografo e amigo presente, Serafim Iglesias, também não pára de carregar no botão. Procura o melhor ângulo, o melhor enquadramento, foca-nos e click.  Aun no me sacaste foto con esta camiseta ! En las próximas vueltas. Tienes que dar unas vueltas mas! Está bem. Pronto. E vão 125 quilómetros para os fotograf@s..
        É chegada a vez de um outro Miñoto me alcançar em pista. Pergunto a Miguel Paínho se está a gostar. Diz-me que talvez para a próxima edição arrisque participar como individual. Bem vindo ao clube dos mais loucos. 126 quilómetros.
         Últimas 2 horas de prova, e aproximasse o grande momento que tanto anseio. Fazer a entrega simbólica do valor conseguido com a campanha Passos e Trotadas Pela Joaninha, pessoalmente à Joana e seus pais em Castrelos. Momento que só vai ser possível graças à boa vontade da organização, em especial do presidente Eusébio Castelain. Num momento em que ainda não os vejo no parque, termino uma volta mais. E vão 127 quilómetros. 
         Ai, ai, ai, ai, ai. Como isto está difícil.  Estou há quase 23 horas a pensar: é agora que vou vomitar. Mas estranhamente isso nunca acontece, e o desconforto mantém-se. E já está mais um quilómetro. E já são 128.
           Vamos Sílvia. No pares!  Leva-me alguns quilómetros de vantagem, o que também não é importante. Volta a repetir a participação individual, e repete o segundo lugar. Enquanto concluo mais uma volta a seu lado, peço uma ovação para: La campeona. La campeona! Bem merece, eu também! E já só falta um quilómetro para os 130. E vai mais um, 129 quilómetros.

Com Sílvia

     Se há muita gente conhecida em Castrelos, que já são verdadeiros amigos,  também há muitos outros que reconheço de anos anteriores, mas que não conheço pessoalmente.  Mas é muito comum ouvires palavras de incentivo seguidas do teu nome vindas de pessoas que não conheces. Um grupo de miúdos vai tentando ler e dizer o meu nome. Nas primeiras passagens sai um Animo Pablo. Por fim corrijo-os: Paulo. P.A.U.L.O.  E quando sai um perfeito Paulo, concluo mais uma volta e mais um quilómetro. 130.


          Confiscada durante as 23 horas pela equipa Os Miñotos, a minha bandeira surge agora nas mãos de Solange Cabral junto à linha de meta. Num período em que já terminou a sua participação por estafetas, pergunta-me se já quero a bandeira. Para a última meia hora. Ainda é cedo. Ainda vou correr com ela durante vários quilómetros. E para já, sem bandeira,  131 estão terminados.
         Nesta última hora, visto a camisa que mandei personalizar para este evento em particular, e que faz referência à causa solidária da minha participação. Na parte da frente, e de forma bem visível lê-se Passos e Trotadas Pela Joaninha, já no verso, além da referência ao valor de cada quilómetro, está estampado o nome de todos quantos contribuíram para esta causa solidária. Creio que em Castrelos, nenhuma das causas solidárias passou em claro. O diário vigues, Faro de Vigo, na apresentação da prova, referia: " Castrelos 20:30, que apoia o projeto solidário Discamino (ajudar pessoas com deficiência a fazer o caminho de Santiago), referiu que a maré solidária não fica por aqui: a equipa Festeiros apoia na prova a associação Down Vigo, o madrilenho Luís Fonteboa pretende dar visibilidade à ELA, e o português Paulo Machado tenta recolher fundos para uma menina, Joana, à qual foi diagnosticada uma doença rara." E vão 132 quilómetros para a Joana.



       

 Última hora. Nas crónicas dos anos anteriores já referi como esta hora é especial, é mágica. O entusiasmo está ao rubro. Trocava todas as outras 23 horas por esta. Mas isso não é possível. Assim que, só nos resta desfrutar desta hora que vai passar num ápice. Quando te deres conta, soa o gongo. Um mais, 133 quilómetros
         Finalmente tenho a bandeira nacional sobre os ombros. Este ano não me representa só a mim, mas sim 9 valentes portugueses que não se amedrontaram com esta competição.  Nove portugueses que vieram competir, divertir-se, mas sobretudo viver 24 horas de enorme felicidade. Venga Portugal. Bonita bandera. Grande país, una verdadera nacion. No es broma, es verdad. Me encanta Portugal. Foi mais ou menos isto o que disse um dos atletas galegos. E com os pensamentos mergulhados nesta grande declaração, concluo uma volta mais. E vão 134 quilómetros por Portugal.
       Avisto pela primeira vez o motivo da minha causa. Luís Lopes, o pai da Joaninha pega no telemóvel e regista o momento em que me vê pela primeira vez. Cumprimento-os com grande emoção. Temi que por qualquer motivo não pudessem aparecer. Disfarço as lágrimas e concluo o quilómetro 135.
       Restam 7' para as 24 horas quando entro em mais uma volta. Será que chegam mais 5.50€?  Não, vou por 5.50€ mais, é o que vou dizendo ás pessoas conhecidas. Quilómetro concluído em 5'. E vão 136 quilómetros.
     Dois minutos. Apenas 2 minutos mais, e tudo estará consumado. Caminho devagar nesta última volta. Junto-me a algumas equipas que dão também a sua última volta triunfal. Na zona próxima da meta, que está mais povoada,  agradeço  os aplausos e os incentivos e cruzo pela última vez a linha de meta. pela 137ª vez. Após 137 quilómetros de felicidade, de alegria, de algum sofrimento, mas sobretudo de dever cumprido.
        Foi pouco? Talvez sim. Talvez não. Para a Joaninha foi pouco. Para todos quantos apoiaram a causa talvez tenha sido muito. Para quem ficou à minha frente foi pouco. Para quem ficou atrás de mim foi muito. Mas para mim não foram 137 quilómetros. Não foram 137 voltas a Castrelos. Não foram 756.24€, se bem que esse foi um dos principais motivos que me moveu durante 24 horas. Para mim foi alegria, felicidade, companheirismo, dedicação, ambição, e solidariedade. 

Entrega simbólica do valor  da campanha Passos E Trotadas Pela Joaninha

       E só de pensar que terminada esta crónica já falta menos tempo para regressar a Castrelos, fico ainda mais feliz.
       Vê-mo-nos em 2017.