terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Km 16 - 2014, um ano de trotadas de A a Z


2014
Um ano de trotadas de A a Z
(e com fotos)
Amigos. Foram muitos os que adicionei ao meu circulo, sobretudo após as 24h de Vigo. São de facto os únicos triunfos de todos os desafios. Também importantes, foram todos aqueles que estiveram presentes em algumas corridas, Barcelos, Vigo, Vale de Cambra, Braga. Esta crónica é para eles, porque se vão identificar mesmo não mencionando nomes.


Barcelos. Na primeira meia maratona de Barcelos vivi a primeira grande satisfação do ano, após cruzar a meta com um tempo de 1h32'. Na altura correspondeu ao meu melhor tempo em meias maratonas.

 
Castrelos. É o nome do parque em Vigo onde se realizou a inesquecível prova de 24 h. Castrelos 20:30 é também o nome do grupo de atletas que organizaram de forma soberba, exemplar, perfeita, sensacional, a mais formidável prova de 2014. Enhorabuena José Vidal Rial e os teus pupilos.
 
 
Desistir. Palavra que continua fora do meu vocabulário. Nunca aconteceu, mas na meia maratona de Coimbra abdiquei dos 21 km, e fiquei pelos 10 da mini maratona. Com maiores ou menores dificuldades, sempre alcancei as linhas de chegada.

 
Espanha. No país vizinho as provas são mais populares. Não há prémios monetários. As inscrições são mais baratas. E o público que assiste ás provas é em grande número e não se cansa de aplaudir, incentivar e interagir com os atletas. Das 20 provas deste ano, 5 foram em Espanha.

 
Fotos. São os registos que vão ficar para a posteridade. Todos nós gostamos de nos ver num grande número de fotos. Em duas provas estive do outro lado, e registei a passagem dos atletas, na meia maratona das areias, em Gaia, e na meia maratona de Coimbra. Também desse lado senti uma satisfação enorme. E graças aos fotógrafos podemos guardar pequenos fragmentos das nossas histórias. Agradeço aos fotógrafos as fotos que me permitem ilustrar esta crónica.



Gonzalez. José Manuel Conde Gonzalez. Venceu as 24 h de Vigo. Um exemplo, uma força da natureza. Com 70 anos venceu de forma categórica a prova e fez jus ao ditado que diz: Velhos são os trapos!

 
Helena Mourão. A mulher pequenina, como foi carinhosamente apelidada por uma jovem espetadora numa prova, deixou-me acompanha-la em grande parte dos desafios, sobretudo nos do circuito nacional de montanha, onde ela tinha um título a defender. Foi com grande prazer que corremos juntos, nos divertimos, ultrapassamos perigos e obstáculos, e alcançamos metas.

 
I O 1 romano. Foram várias as provas que realizaram a sua 1ª edição neste ano, e eu estive lá nas suas estreias. Desde a I meia maratona de Barcelos e de Coimbra. As primeiras edições das 24 h de Vigo e de Portugal. A I Maratona Internacional de Tânger. O 1º Trilhos do Marão e trail de Vila Pouca de Aguiar. E a 1ª edição da São Silvestre de Vila Meã. Sou totalista em todas elas, até quando??


José Manso. Conheci-o nas 24 h de Vigo. Voltei a dividir a pista com ele nas 24 h de Portugal. Um luxo poder correr ao lado de tão notável e humilde atleta.

 
Km (Quilómetros). Foram centenas os contabilizados este ano. Só em provas foram 648 km. Divididos em 20 corridas e alcançados em cerca de 87 horas de passos e trotadas. O máximo foi conseguido nas 24h de Portugal, 140 quilómetros. A corrida mais curta foi a São Silvestre de Braga, com apenas 8 km.

 
Ligamentos. Não tive lesões ao longo de 2014, apesar de ter começado o ano a curar uma micro rotura. Mas após as 24h de Portugal, tive de recorrer a tratamentos de terapia. " Fritas-te o ligamento". Estas as palavras da terapeuta ao observar o meu joelho, um dia depois de ter completado 140 quilómetros.
 

Marina Gabriel. A ela agradeço o facto de as minhas paragens por lesão serem mais curtas que o espectável. É a minha terapeuta de serviço. SOS MARINA.

 
Nostalgia. É com grande nostalgia que recordo as corridas de 2014, algumas mais que outras. Das 24 horas de Vigo guardo os momentos mais nostálgicos.

 
Onze. O meu número de dorsal nas 24h de Vigo. A mais bela corrida que fiz até hoje.

 
Pódio. Aconteceu nas 24h de Portugal. 2º lugar no escalão, sénior masculino. Na geral fiquei pelo 7º lugar. Mas teve um sabor muito especial, por ter sido a primeira vez, e por ter sido após uma larga ultramaratona de 24h.


Quatro. Mais um número muito especial porque correspondeu ao meu dorsal nas 24h de Portugal.

 
Record. Ou Personal Best. Aconteceu por 3 vezes este ano. Em Barcelos, na meia maratona, onde com 1:32h consegui o meu melhor tempo. Nas 24h de Portugal, onde somei mais 14 quilómetros que em Vigo. E muito recentemente, na meia maratona de Vilagarcia de Arousa, com um tempo de 1:29h.

 
Seiscentos e quarenta e oito quilómetros, somados apenas em provas ao longo de 2014.
 
Tânger. Foi nesta cidade marroquina que realizei a única maratona de estrada do ano. Uma muito agradável experiência, quer pelos bons e maus momentos vividos durante a corrida, quer pela oportunidade que tive de conhecer a cidade e as suas gentes. Um povo maravilhoso.

 
Ultramaratonista. Nova especialidade conseguida este ano. Em três provas ultrapassei os 42 clássicos quilómetros da maratona. Aconteceu nas 2 provas de 24h, e também na Maratona de Tânger, porque chegou aos 43 quilómetros, mais um que a distância oficial.

 
Vinte e Quatro horas vezes dois. Aconteceu num espaço de 3 semanas. Em momento algum me arrependi de o ter feito, e são provas que quero repetir mais vezes, com o propósito único de desfrutar, me divertir e fazer amigos.

 
XX Total de corridas em que participei. Duas provas de 24 h. Uma maratona. Nove meias maratonas. Duas São Silvestre. Um trail. E mais cinco corridas do circuito nacional de montanha.
 


Zero. É assim que vai começar 2015. Zero quilómetros. Zero corridas. Começa tudo de novo. Novas corridas, novos desafios, novos amigos, novas experiências, novo clube, novas viagens, novas crónicas, novos leitores, novas criticas. A mesma paixão, o mesmo empenhamento, a mesma alegria.
 


FELIZ 2015!

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

km 15 - Maratona de Tânger



I Maratona Internacional de Tânger
 

9 de Novembro de 2014

 
 
 
      "...quando se tem um bom tema para escrever, o  resultado no papel é sempre bom."
  

                                                             KM 0, Linha de Partida
                                                
          


      Quero a minha mala!

       Passou mais de um mês sobre a aventura da minha 4ª Maratona, e só agora consigo partilhar convosco o bom ou o mau do momento.  Quando comecei a escrever no meu blogue, na minha primeira crónica, referi que não teria grandes dificuldades em escrever belos textos, quando a materia prima sobre a qual iria escrever fosse sobre belos momentos. Não quero qualificar esta minha experiência em solo Africano nem como bom, nem como mau momento, apenas dizer que foi uma aventura diferente. E depois da Cidade do México,  Madrid, e Frankfurt, esta maratona é  completamente o oposto de todas as outras em que participei.  Longe dos cerca de 15 mil participantes da maratona de Frankfurt. Longe dos cerca de um milhão de espetadores que  assistiram à prova na Cidade do México. Longe das excelentes organizações das maratonas anteriores. É verdade que se trata da primeira edição, mas foram cometidos demasiados erros. Os abastecimentos depois dos 21 km desapareceram. O trânsito após as 2:30h de corrida retomou a circulação. A classificação final é suspeita. Contei os atletas que iam à minha frente, e com alguma margem de erro, a minha classificação apontava para um lugar pelo 35º posto. No final surjo no 47º lugar. Provavelmente alguns atletas apanharam um táxi. Não me admira nada, eu só não o fiz porque não tinha uma moeda comigo, porque as dificuldades que passei após os 30 quilómetros, sugeriam que me dirigisse á zona de chegada de outra forma que não fosse a correr ou a caminhar.
      Mas este desafio parece estar destinado ao fracasso desde o primeiro momento em que pisamos  solo africano. Para a história do desafio e da viagem fica o fato de a Helena me ter acompanhado, ou de eu ter acompanhado a Helena nesta  sua aventura cheia de estreias. Desde longo a sua primeira viagem de avião, e a primeira viagem fora do continente Europeu.
      Tudo parece estar a correr bem até ao momento, em que aterramos em Tânger. A viagem e a escala em Madrid foi feita sem problemas. Descemos as escadas desde o Airbus, fazemos as primeiras fotos da praxe no minúsculo aeroporto Internacional de Tânger  e percorremos os escassos metros que nos separam do edifício principal sem recurso a mangas ou a  autocarros. Chegamos á zona de recolha das bagagens, e já as malas estão a circular no tapete. A Helena recolhe a dela, a minha não aparece. Soa o alarme. O momento que mais tenho temido ao longo de todos estes anos em que tenho calcorreado um pouco por todo o mundo, recai sobre mim. Pergunto ao funcionário presente no local se não há mais malas, e ele dispara um sonoro e italiano finito, como se fosse um dos mais comuns acontecimentos no aeroporto. Mais tarde tenho conhecimento de que é perfeitamente normal as malas não chegarem junto com os passageiros a Tânger. O infinito tempo que gastamos a preencher a ficha de reclamação, faz com que percamos também o transfer que nos deveria levar ao hotel.
      Antes de embarcar-mos nesta nossa viagem, elaborei um plano que nos permitisse usufruir ao máximo do escasso tempo que vamos passar em África. A maratona vai gastar-nos  algum tempo, mas dispomos ainda de largas horas para algumas visitas aos locais mais recomendados da cidade e arredores. Com este pequeno/grande contratempo, as restantes horas do dia de sábado, vão ser gastas a levantar o dorsal, a comprar novo equipamento desportivo, a jantar e a descansar. Na primeira tarefa acabamos  por despender mais tempo do que o desejado. Apesar de um grande número de táxis azuis circular pelas ruas (foram os táxis que nos recomendaram que apanhássemos, porque eram menos dispendiosos), não conseguimos encontrar nenhum completamente livre. Acontece que estes táxis são comunitários, ou seja, são partilhados por vários passageiros. Por fim pára um, e pedimos que nos leve a Dradeb, mais propriamente ao pavilhão de Dradeb. Por azar, o taxista apenas fala árabe. Tento explicar-lhe que queremos ir ao pavilhão de Dradeb. Ele apenas entende a palavra Dradeb, que é uma zona da cidade, e, quando já nessa zona, reduz de velocidade como que a convidar-nos a sair. Eu mando avançar, e vou repetindo Dradeb. Cansado de o ouvir perguntar se já pode parar, eu digo que sim, pois talvez encontremos nas ruas alguém que fale espanhol, francês ou inglês que nos indique o pavilhão. Mas, depois de alguns azares e ainda sentado no táxi, olho para a esquerda e vejo o pavilhão desportivo. Parece que a nossa sorte começa a mudar.
       Levantamos os dorsais, pedimos informações sobre onde comprar material desportivo, metemo-nos dentro de um novo táxi azul e rumamos ao centro da cidade. Compro o material que me faz falta para substituir o que ficou retido na mala. Umas sapatilhas, das mais baratas, calções e meias. A camisa não compro, vou usar a que foi oferecida pela organização da prova. Gastamos o que resta do final de dia para jantar e recolhemos ao hotel para descansar.

Cartaz da prova


          Allez!Allez!

         Domingo, dia do grande desafio. Despertar as 6h. Pequeno-almoço às 6.30h. Á saída do hotel outros dois atletas oferecem-nos boleia. Agradecemos e entramos para um dos milhares de Dacia que circulam nas ruas de Tânger. A viagem é curta, apenas um par de quilómetros. Depois de algum tempo em busca do guarda roupa, fazemos um breve aquecimento. Não há informação sonora, e quando todos os atletas se encaminham para a zona de saída nós acompanhamo-los. Não somos mais de 100 na zona de saída. Passa um pouco das 9 horas quando é dado o tiro de partida. Está lançado o desafio. O objetivo passa por fazer melhor do que nas maratonas anteriores, para isso conto com a experiência da Helena. A cada quilómetro que vamos eliminando, pergunto-lhe o ritmo a que vamos. Se bem se recordam, também na minha mala estava o meu relógio. Tínhamos  pensado fazer á volta de 5' o quilómetro, e nos primeiros estamos a cumprir.  Estamos sobre o km 7, e a Helena baixa o ritmo. Queixa-se de dor de burro, e pede-me que continue. Porque me sinto bem, avanço, literalmente sozinho. Á minha frente com cerca de 100 metros de avanço vai um atleta, atrás de mim vem a Helena. Até aos 10 quilómetros o trajeto foi um constante sobe e desce. Dos 10 e até aos 21 aproveito o desnível negativo para avançar mais velozmente. Na segunda metade da prova vamos fazer o percurso no sentido inverso. Adivinham-se grandes dificuldades, mas, porque o percurso assim convida, aproveito para aumentar o ritmo e rodar mesmo a 4'18'' entre os 10 e os 15 quilómetros. Durante estes quilómetros ultrapasso alguns atletas que vou incentivando com palavras  de  allez, allez! Completo a  meia maratona sem qualquer referência de tempo gasto. Pergunto a alguns voluntários presentes, mas ninguém me informa. Aproveito para me alimentar, apenas com alguma fruta que vão distribuindo. Tenho necessidade de alguns alimentos salgados e da minha água, mas estes estão algures entre Madrid e Tânger, assim espero.  Algumas centenas de metros após o retorno cruzo-me com a Helena. 1:45h diz-me depois de lhe perguntar o tempo. Estamos a cumprir com o objetivo. Um atleta informa-me que estou na 33ª posição. Já havia tentado o mesmo exercício após cruzar-me com os atletas á minha frente, mas perdi-me nas contas. Se até aos 21 o percurso era a descer, agora é a subir, e o vento forte do Atlântico está agora de frente. Apesar das dificuldades consigo ainda chegar á 30ª posição após passar por mais 3 atletas. Para dificultar ainda mais, os abastecimentos desapareceram, só por volta dos 30 quilómetros, um carro da organização aparece a  distribuir água ao longo do percurso.

A única foto da corrida, retirada de um vídeo promocional do evento.

       Últimos 10 quilómetros do desafio e estou incapaz de dar um passo mais que seja. A larga ausência de hidratação parece ter-me provocado sérios problemas. Sinto náuseas, paro para vomitar, o trânsito, estranhamente, retoma a circulação. Perco-me numa rotunda, e sou alertado por um condutor que me indica a direção correta. Um a um, os atletas que fui ultrapassando numa fase mais vigorosa da minha prova, vão passando por mim. Também a Helena, e precisamente no mesmo local onde a abandonei, pelo quilometro 7, passa por mim. Ainda tento acompanhar o seu ritmo, mas sou incapaz. Faço uma paragem mais longa, e vomito uma e outra vez a escassos 2 quilómetros do fim. Um carro da polícia para, e um militar oferece-me ajuda. Agradeço a água que me dá e a ajuda, mas digo que com alguns minutos de pausa me recomponho. Até á linha de meta a tarefa torna-se penosa, sofrível, mas passo a passo, trote a trote avanço em direção á linha de chegada, onde a Helena aplaude e aguarda a minha chegada. Dispenso um olhar fugaz ao relógio, e após 4h05' de prova, consigo finalmente ter acesso ao meu tempo.
       Termino sem a euforia habitual. Termino sem a satisfação de outros desafios. Termino a repetir comigo mesmo que nunca mais me meto noutra. É o sentimento habitual que me provocam os desafios menos conseguidos.
        No regresso ao hotel prolongamos o sofrimento da prova. A Helena tem cãibras e é ajudada por um marroquino porque eu sou incapaz de a auxiliar pois estou a contas com novos vómitos, que se prolongam pela tarde  durante um par de horas.


Parte do percurso plano junto á saída e chegada da prova

        
        Depois de me recompor, viajamos até ao aeroporto, onde recolho a minha tão desejada mala. O taxista que nos transporta revela-se um autêntico guia turístico, e com o seu auxilio conseguimos percorrer e conhecer alguns dos locais que tínhamos pensado visitar.
          Foi uma viagem relâmpago a Tânger, onde nem tudo correu bem. Onde os azares se sobrepuseram aos momentos de sorte, mas onde a experiência vai ficar para sempre na nossa memória, quer pelos bons, quer pelos maus momentos. Para regressar a Tânger? Sim, com toda a certeza. Para correr a maratona? Mais de um mês após a prova, a resposta é diferente da que daria no dia da prova. Sim, gostava de repetir.

Medina de Tânger


Para a estatística:

      Maratona número 4
      Tempo líquido (chip): 4h05'10''
      Classificação geral: 46 (63)
     


     Até já!